A indústria da aviação tem procurado maneiras de reduzir sua pegada de carbono global na última década, como a compra das chamadas compensações de carbono – com projetos de plantio de árvores ou parques eólicos – para compensar o CO2 (Dióxido de Carbono) expelido por aviões. Ao mesmo tempo, aeroportos em São Francisco, Chicago e Los Angeles (EUA), junto com uma dúzia na Europa, estão abastecendo aviões com combustíveis alternativos mais ecológicos para ajudar a alcançar as metas de redução de carbono.
Agora, uma equipe da Universidade de Oxford, no Reino Unido, desenvolveu um processo experimental que pode ser capaz de transformar o CO2 – que é um gás de efeito estufa emitido por todos os motores a combustão, inclusive dos motores de aviação. Se for bem-sucedido, o processo, que usa uma reação química à base de ferro, pode resultar em emissões “líquidas zero” dos aviões.
O experimento, publicado na revista Nature Communications, foi realizado em um laboratório e ainda precisa ser replicado em maior escala. Mas, os engenheiros químicos que projetaram e executaram o processo estão esperançosos de que ele possa mudar o jogo na questão do clima.
A mudança climática está se acelerando e temos enormes emissões de dióxido de carbono. A infraestrutura de combustíveis de hidrocarbonetos já está lá. Este processo pode ajudar a aliviar as mudanças climáticas e usar a atual infraestrutura de carbono para o desenvolvimento sustentável”, diz Tiancun Xiao, pesquisador sênior do Departamento de Química de Oxford e autor do artigo.
Quando combustíveis fósseis como petróleo ou gás natural queimam, seus hidrocarbonetos são transformados em dióxido de carbono, e água e energia são liberadas. Este experimento reverte o processo, transformando o dióxido de carbono em combustível usando um método chamado de “Combustão Orgânica (OCM)”. Adicionando calor (350 graus Celsius), ácido cítrico e hidrogênio em um catalisador feito de ferro, manganês e potássio, a equipe foi capaz de produzir combustível líquido do escape do CO2, algo que funcionaria em um motor a jato, por exemplo. O experimento foi feito em um reator de aço inoxidável e produziu apenas alguns gramas da substância.
Mas a ideia de adaptar o conceito para o mundo real seria capturar grandes quantidades desse gás de efeito estufa em uma fábrica ou diretamente do ar para retirá-lo do meio ambiente. O dióxido de carbono é o mais comum dos gases de efeito estufa que aquecem o planeta. Mantê-lo fora da atmosfera pode ajudar a reduzir o aquecimento global, embora as emissões de carbono no mundo tenham aumentado nas últimas décadas e podem aquecer o planeta em 2 graus Celsius até o final deste século.
Xiao e seus colegas dizem que o novo método também seria mais barato do que os métodos existentes que transformam hidrogênio e água em combustível, um processo chamado hidrogenação, principalmente porque usaria menos eletricidade. Xiao prevê a instalação de uma planta de combustível para aviação próxima a uma fábrica de aço ou cimento ou uma usina de carvão, capturando assim o dióxido de carbono excedente para fazer o combustível. O processo também pode envolver a sucção de dióxido de carbono da atmosfera, algo chamado de captura direta de ar. O catalisador que faz o truque é abundante na Terra e requer menos etapas do que outros métodos de sintetizar produtos químicos de alto valor agregado.
Um especialista que não esteve envolvido no experimento diz que o conceito parece promissor, contanto que os autores consigam descobrir como ir da produção de quantidades minúsculas de combustível para aviação em laboratório a quantidades maiores em uma planta piloto.
Isso realmente parece diferente e pode funcionar. O aumento de escala é sempre um problema, e há novas surpresas quando você vai para escalas maiores. Mas, em termos de uma solução a longo prazo, a ideia de uma economia circular de carbono é definitivamente algo que pode ser o futuro.” diz Joshua Heyne , professor associado de engenharia mecânica e química da Universidade de Dayton.
Nesta tal “economia circular de carbono”, o dióxido de carbono se tornaria tanto um fluxo de resíduos quanto uma fonte de combustível. Um maior retorno do investimento em carbono aconteceria se uma fábrica de combustível de aviação alternativa pudesse operar com eletricidade verde proveniente da energia eólica ou solar. Dessa forma, tanto o combustível de aviação quanto a fonte de dióxido de carbono seriam produzidos de forma sustentável, de acordo com Oskar Meijerink, líder do projeto para combustíveis futuros da SkyNRG, uma empresa holandesa que produz, compra e vende combustíveis de aviação sustentáveis para vários aeroportos.
Você precisa usar eletricidade renovável. O desafio é, se estamos usando CO 2 de uma usina siderúrgica, como podemos fazer com que ela seja neutra em carbono? A solução perfeita seria ter todas essas indústrias mais sustentáveis e usar isso para fazer a captura direta de ar”, diz Meijerink.
Quanto ao experimento de Oxford e seu novo combustível de aviação à base de dióxido de carbono, provavelmente deverá se alinhar com uma série de outros candidatos que estão sendo testados agora como alternativas ao combustível de aviação tradicional. Esses combustíveis alternativos são feitos de matérias-primas que incluem resíduos sólidos urbanos, palha, biomassa lenhosa e até mesmo resíduos de óleo de cozinha, um processo que está sendo perseguido pela gigante de energia BP.
Xiao, da Oxford, acredita que o novo combustível de CO2 tem uma chance de lutar para competir com essas alternativas. Xiao fundou a empresa de combustível verde Oxford Catalysts, agora conhecida como Velocys, em 2006. A Velocys está desenvolvendo combustíveis alternativos de aviação para a Shell e a British Airways em uma instalação britânica que usa resíduos municipais como matéria-prima e óleo diesel para caminhões a partir de resíduos de papel e madeira de uma fábrica no Mississippi (EUA).
Ele diz que está discutindo o novo método de conversão de dióxido de carbono com vários grandes parceiros industriais.
Não há grandes desafios, mas precisamos otimizar o processo e torná-lo mais eficiente”, completa Xiao.
A pesquisa foi publicada na revista científica Nature e pode ser acessada neste link.