A precipitação, fonte de toda a água doce, não pode mais ser considerada confiável: O ciclo natural e global da água está desiquilibrado pela primeira vez na história humana.
Mais da metade da produção mundial de alimentos está em risco de colapsar nos próximos 25 anos devido a uma crescente crise global de água, alerta um novo relatório.
Quase 3 bilhões de pessoas e mais da metade da produção global de alimentos estão em áreas que enfrentam “estresse sem precedentes” em seus sistemas hídricos, disse a Comissão Global sobre a Economia da Água em um relatório publicado em 17 de outubro de 2024. A causa é uma velha conhecida: mudanças climáticas, o uso destrutivo do solo e a má gestão dos recursos hídricos.
Porém, se a tendência não for revertida, o déficit crescente terá um impacto sísmico na humanidade e no meio ambiente. Várias cidades já estão afundando devido à perda de águas subterrâneas. Além disso, até 8% do Produto Interno Bruto (PIB) global e 15% do PIB dos países de baixa renda serão perdidos até 2050, informa o relatório.
Hoje, metade da população mundial enfrenta escassez de água… À medida que este recurso vital se torna cada vez mais escasso, a segurança alimentar e o desenvolvimento humano estão em risco e estamos permitindo que isso aconteça. Pela primeira vez na história humana, estamos levando o ciclo global da água ao desequilíbrio. A precipitação, fonte de toda a água doce, não pode mais ser considerada confiável devido às mudanças climáticas e no uso do solo causadas pelos humanos, minando a base do bem-estar humano e da economia global”, disse Johan Rockström, diretor do Instituto Potsdam para Pesquisa de Impacto Climático (PIK) e um dos quatro copresidentes da comissão, em um comunicado.
Cada pessoa precisa de um mínimo básico de 50 a 100 litros de água por dia para sua saúde e higiene, mas a comissão descobriu que esse número, no qual os governos frequentemente se baseiam, é espantosamente subestimada.
O número real para consumo adequado e uma vida digna está mais próximo de 4.000 litros por pessoa a cada dia, escreveram os autores do relatório. Esse volume é inalcançável em muitas partes do mundo, o que coloca uma pressão adicional sobre o comércio para fornecer alimentos, roupas e bens de consumo adequados.
As abordagens atuais para a crise hídrica focam predominantemente na “água azul“, encontrada em rios, lagos e aquíferos, enquanto ignoram a vital “água verde” contida no solo e nas plantas. Essa água circula pelo mundo em rios atmosféricos para gerar aproximadamente metade das chuvas que caem em terra.
Áreas na Índia, China, Rússia e Europa são altamente dependentes do fluxo de água verde, o que as coloca sob ameaça cada vez maior de escassez de água à medida que os sistemas meteorológicos são interrompidos.
Nos últimos anos, a Amazônia passou por secas severas que ameaçam transformar a floresta tropical em savana, as geleiras derreteram a velocidades sem precedentes e a Europa sofreu inundações mortais. Um estudo anterior também destacou os perigos na América do Norte, onde a projeção indica quase metade das bacias de água doce dos Estados Unidos abaixo da demanda até 2071.
O subpreço generalizado da água em muitas áreas agrava a questão. Isso permite que o uso da água em regiões já estressadas seja desviado para centros de dados em rápido crescimento e usinas termelétricas a carvão. Ao introduzir um preço adequado e subsídios, mudar para dietas à base de plantas, restaurar habitats naturais e reciclar águas residuais, os pesquisadores argumentam que a água pode ser distribuída de forma mais eficiente e equitativa.
A crise global da água é uma tragédia, mas também é uma oportunidade para transformar a economia da água e começar a valorizar a água de forma adequada para reconhecer sua escassez e os muitos benefícios que ela proporciona”, disse Ngozi Okonjo-Iweala, diretora-geral da Organização Mundial do Comércio e copresidente da comissão, em comunicado.
A Comissão Global sobre a Economia da Água foi criada na Holanda em 2022, utilizando a experiência de dezenas de cientistas e economistas para criar um relatório de 202 páginas avaliando todos os aspectos da crise atual e sugerindo soluções para os políticos.
Com informações de Live Science e The Economics of Water.