Pesquisadores liderados por Marvin Tanenbaum, do Instituto Hubrecht, mostraram que a tradução da informação genética armazenada em nosso DNA é muito mais complexa do que se pensava anteriormente. Esta descoberta foi feita através do desenvolvimento de um tipo de microscopia avançada que visualiza diretamente a tradução do código genético em uma célula viva. Seu estudo foi publicado na revista científica Cell no dia 6 de junho.
Do gene à proteína
Cada célula do nosso corpo contém o mesmo DNA, mas células diferentes, como células cerebrais ou células musculares, têm funções diferentes. As diferenças na função das células dependem de quais partes da informação genética (chamadas genes) estão ativas em cada célula.
A informação genética armazenada nesses genes é traduzida por fábricas de tradução especializadas chamadas ribossomos. Os ribossomos leem o código genético e montam proteínas com base nas informações armazenadas neste código genético, de forma análoga a uma fábrica que constrói uma máquina baseada em um projeto.
As proteínas são os burros de carga de nosso corpo e executam as funções codificadas em nossos genes. Para que nossas células e órgãos funcionem corretamente, é fundamental que a informação genética armazenada em nossos genes seja traduzida com precisão para as proteínas. Se o código genético é traduzido incorretamente, proteínas nocivas podem ser produzidas.
O ‘quadro de leitura’ dos genes
O código genético é traduzido em grupos de 3 letras, cada uma parecida com uma palavra, que é traduzida em uma única parte da proteína. Se um ribossomo começar a traduzir o código na posição errada, pode ocorrer uma mudança no código de 3 letras. Por exemplo, a frase abaixo deve-se ler:
The man saw his new red car” (“O homem viu o seu novo carro vermelho”, em português)
No entanto, se um ribossomo começar a traduzir esta frase com leitura atrasada de uma letra, a frase seria:
hem ans awh isn ewr edc ar”
No caso do código genético, esse fenômeno é chamado de tradução fora de quadro. Sanne Boersma, pesquisador do Instituto Hubrecht explica:
Como ilustrado pelo exemplo, a tradução fora de quadro tem um grande efeito sobre a proteína e geralmente resulta em uma proteína que se comporta de maneira diferente e pode danificar a célula”.
Até agora, não estava claro como o ribossomo sabe onde começar a traduzir o código e com que frequência o ribossomo se engana.
Um novo método: SunTag e MoonTag
Os pesquisadores desenvolveram um novo método para visualizar a decodificação de nossa informação genética em células vivas. Eles foram capazes de rotular diferentes produtos de proteínas em diferentes cores e visualizar a produção de cada tipo de proteína usando microscopia avançada.
Cada proteína foi rotulada usando um rótulo específico, chamado SunTag e MoonTag (algo como ‘etiqueta Sol’ e ‘etiqueta Lua’, em inglês) que eles puderam ver através do microscópio (figura abaixo). Combinando o MoonTag e o SunTag, os pesquisadores puderam ver pela primeira vez com que frequência a tradução fora do frame acontece.
Uma grande surpresa
Os pesquisadores descobriram que a tradução fora do quadro acontece com uma frequência surpreendente. Em casos extremos, quase metade de todas as proteínas que foram construídas usavam um quadro ou código de leitura diferente do código esperado.
Essas descobertas surpreendentes mostram que a informação genética armazenada em nosso DNA é muito mais complexa do que se pensava anteriormente. Com base no novo estudo, nosso DNA provavelmente codifica milhares de proteínas desconhecidas com funções desconhecidas.
Por causa do nosso estudo, podemos agora fazer perguntas muito importantes: o que todas essas novas proteínas fazem? Elas têm funções importantes em nosso corpo ou são produtos secundários da tradução que podem danificar nossas células?”, questionou Sanne Boersma.
A pesquisa completa foi publicana na revista científica Cell e está disponível neste link.